sábado, 5 de junho de 2010

Caso Anhanguera


A educação vai a bolsa de valores
Faculdades abrem o capital para crescer – e os estudantes também podem ganhar com isso

Camila Pereira
Lailson Santos


Antonio Carbonari, da Anhanguera: de um negócio entre amigos à bolsa de valores

Poucos setores têm se transformado tanto no Brasil quanto o de ensino superior privado. O sinal mais claro disso é a recente entrada das universidades na bolsa de valores. Quatro grupos já abriram seu capital e logo virão pelo menos mais três, entre eles o Iuni (do Centro-Oeste), o Maurício de Nassau (o maior do Nordeste) e o Veris Educacional, ao qual pertence o Ibmec. O presidente do Veris, Eduardo Wurzmann, resume a motivação comum a essas empresas: "Não há maneira melhor de patrocinar a expansão das universidades". Redes de ensino superior não são uma novidade no país. Elas surgiram cerca de dez anos atrás. Com a bolsa, agora, ganham um novo – e decisivo – impulso. O grupo Kroton, dono das escolas e faculdades Pitágoras, chegou à bolsa com oito faculdades e hoje tem 25. O Anhanguera passou de dezessete para 47 instituições em pouco mais de um ano. Foi o grupo que mais deu certo: o valor das ações já cresceu 50%. Trata-se ainda de um caso emblemático da profissionalização pela qual passam as universidades. Basta saber que o presidente do grupo, o professor de matemática Antonio Carbonari Netto, resolveu abrir sua primeira faculdade no interior de São Paulo baseado numa "intuição". Uniu-se a três colegas e hipotecou a própria casa para conseguir um empréstimo no banco. "Virei empresário sem saber o básico", conta ele. Hoje, recebe investidores estrangeiros interessados em comprar suas ações.
O ingresso das faculdades no mercado de capitais não provoca apenas uma mudança fundamental na condução desse tipo de negócio no país. Pode representar, também, um avanço para os alunos. Foi o que se viu nos Estados Unidos, onde as universidades começaram a aventurar-se na bolsa quinze anos atrás. A breve experiência brasileira aponta para o mesmo tipo de ganho: mensalidades mais baixas, avanços na infra-estrutura e, por vezes, até a melhora do ensino. Ao abrirem o capital, as universidades juntam dinheiro para esparramar-se por vários endereços e logo se transformam em redes de ensino, nas quais tudo é pensado em grande escala. Na prática, nenhum funcionário vai mais à loja vizinha comprar papel e tinta ou uma impressora nova. Esses artigos são encomendados aos milhares, o que reduz os custos. Torna-se possível, por exemplo, a compra de equipamentos para um laboratório pela metade do preço – daí as chances de a infra-estrutura melhorar. Com esse tipo de economia, a margem de lucro de uma faculdade, que normalmente beira os 7%, chega a 20%. É por isso que grupos que entraram na bolsa, como Anhanguera e Estácio de Sá, conseguem cobrar mensalidades até 50% mais baixas.
Para certas faculdades, a entrada na bolsa acaba tendo ainda impacto positivo no nível do ensino (o que não faz mal às universidades brasileiras). Uma das razões remete, de novo, aos ganhos de escala. Numa rede, os custos com a confecção de currículos e material didático (parte do negócio que sai caro para as universidades) caem drasticamente. O mesmo material é adotado em dezenas de faculdades. Foi justamente por isso que o Kroton (grupo já tradicional no ensino básico, como o SEB, outro que entrou na bolsa) investiu alto na contratação de uma equipe de especialistas em diversas áreas, com a missão de elaborar um plano pedagógico. Outro fator que pode impulsionar a melhora do ensino diz respeito à simples lógica do mercado: faculdades muito ruins espantam os investidores e, por isso, aquelas que vão à bolsa têm de se preocupar mais com o lado acadêmico. Diante de notas baixas em alguns de seus cursos em provas aplicadas pelo Ministério da Educação, a Anhanguera decidiu enviar professores para um curso de reciclagem.
A experiência de entrar na bolsa nem sempre é fácil, especialmente para um setor tão pouco profissionalizado. Para abrir o capital, os grupos precisam apresentar três anos de contas auditadas, um conselho de administração e metas bem definidas de expansão. Freqüentemente, uma reorganização dolorosa do negócio é necessária. A Estácio de Sá, o maior grupo de ensino superior do país, com quase 200 000 alunos, passou por maus momentos depois que entrou na bolsa. Faltou planejamento. Para se ter uma idéia, apenas seis meses antes da abertura do capital o grupo se tornou, oficialmente, uma instituição com fins lucrativos, requisito básico para o IPO. A evidente desorganização afastou os investidores, e o valor das ações caiu à metade. A reação veio há dois meses, quando o GP Investimentos, o maior gestor de recursos de terceiros no Brasil, comprou 20% das ações. Conferiu credibilidade ao negócio. O que atrapalhou a Estácio foi justamente o trunfo da Anhanguera. O grupo, hoje com 47 faculdades e previsão de faturamento neste ano de 600 milhões de reais, começou a se preparar para abrir o capital com quatro anos de antecedência. A transição deu-se com a supervisão do fundo de investimentos Pátria, hoje dono de 50% das ações. Enquanto os grandes grupos crescem, as pequenas faculdades sofrem. Como sabem que será difícil competir com uma rede de ensino, seus donos começam a passar o negócio adiante.
Ocorre hoje no Brasil um fenômeno que teve início nos Estados Unidos, na década de 90, quando grupos de ensino abriram capital na bolsa, motivados pela expansão num nicho até então pouco explorado: o ensino universitário para gente mais velha. Deu certo. O recente ingresso das faculdades brasileiras na bolsa é impulsionado por uma outra realidade, mais parecida com a da China e da Índia, onde grupos de ensino também abrem seu capital. Esses países têm ainda muitos jovens fora das universidades (87% deles no Brasil) e vivem momentos de expansão da economia – o que significa mais dinheiro no bolso das pessoas para pagar por educação. Não por acaso, são boas as perspectivas de expansão do faturamento nesse setor: os 20,5 bilhões de reais deste ano devem chegar a 28 bilhões de reais em 2012, segundo uma projeção da consultoria Hoper. São números polpudos o bastante para atrair estrangeiros. Eles já são a maioria dos investidores em universidades brasileiras na bolsa – e têm apostado também fora do mercado de ações.
O grupo americano Laureate foi o primeiro a se tornar sócio de uma universidade brasileira, a Anhembi Morumbi, em 2005. Na semana passada, o igualmente americano Apollo, o maior grupo de ensino do mundo, ofereceu 2,5 bilhões de reais pela Universidade Paulista (Unip), do empresário João Carlos Di Genio. É a maior proposta já feita nesse mercado. Mais um sinal de que a educação no Brasil se tornou não apenas um bom negócio, mas um negócio diferente.

7 comentários:

  1. Roberta disse:
    O que podemos perceber é que, com a expansão do mercado de faculdades, todos saem ganhando, tanto os investidores (donos das faculdades), como o ensino em si, beneficiando também os alunos. Os benefícios para os alunos incluem, infra-estrutura melhor, ensino com mais qualidade e mensalidades mais baratas. Com isso, a expansão do conhecimento traz melhoria para o País, podendo atingir ás classes mais baixas que não tem condições de ingressar em uma faculdade.

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  2. A educação é um fator primordial para o desenvolvimento de uma massa pensante em qualquer país. É o capital intelectual formado no país que dá a base para o crescimento. A mercantilização da educação, a meu ver, tem dois lados. Ela pode ser boa ao permitir o acesso de uma parcela maior da população ao ensino superior, ajudando a formar a já referida massa pensante no país. Porém, se feita de forma desordenada, sem nenhum rigor e acompanhamento estatal, essa privatização da educação pode acabar prejudicando mais do que beneficiando, já que as empresas procuram, primordialmente, o lucro. Portanto, a educação de qualidade seria posta em segundo, terceiro, quarto plano, em detrimento dos interesses dos sócios acionistas.

    Acho, então, que, se for bem orquestrada, com regras e objetivos claros e avaliações periódicas, a mercantilização da educação pode ser benéfica para o Brasil, formando um capital intelectual de grande importância para alavancar o Brasil à condição de país desenvolvido.

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  3. Márcia disse...

    A educação é um dos setores mais importantes para o desenvolvimento de uma nação. É através da produção de conhecimentos que um país cresce, aumentando sua renda e a qualidade de vida das pessoas. Embora o Brasil tenha avançado neste campo nas últimas décadas, ainda há muito para ser feito.

    Espero que com a inserção das faculdades no mercado de valores haja realmente mais investimentos no setor,que mais pessoas consigam ingressar na vida acadêmica.

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  4. Sem dúvida a educação hoje é super importante para que possamos ter uma sociedade mais justa e com um capital intelectual avançado.
    Dessa forma com a inserção das universidades na bolsa fará uma grande diferença gerando assim aberturas para que as pessoas possam se ingressar de forma mais flexível mantendo assim a educação justa para todos.

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  5. A educação é de suma importância para que o País se torne competitivo. Espero que os investidores tenham a mesma opinião.

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  6. A busca pelo conhecimento é contínua e necessária para que o homem torne possível a realização de seus anseios. Existe um favorecimento ainda maior quando se pode contar com um ensino de qualidade. Hoje o número de instituições de ensino existentes é imenso, mas com certeza a qualidade dos serviços vai ser cada vez mais exigida; a sociedade e também as instituições têm só a ganhar.

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  7. Melhorias contínuas vão acontecer nos setores de educação privada depois da entrada das mesmas na bolsa. Com a redução das mensalidades uma maior quantidade de pessoas terão acesso ao ensino superior e com uma infraestrutura melhor. O que me preocupa é a possibilidade de encontrarmos uma faculdade em cada esquina por terem tantos pontos positivos, inclusive um melhor retorno financeiro.

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